Dom Francisco de Assis Dantas de Lucena
Bispo Diocesano de Guarabira
Secretário da CNBB - Regional Nordeste 2
A atual
Constituição Brasileira tem de modo explícito o cuidado do Estado em matéria de
liberdade religiosa (cf. Inciso VI do art. 5º), como toda a tradição social
jurídica e religiosa do Brasil. Contudo, nesta época de pós-modernidade, com o
ressurgimento das formas de laicismo de matiz iluminista, tristemente, tem se
espalhado uma visão míope e distorcida do que seja a laicidade do Estado. Surgem,
hoje, formas sutis de preconceito religioso ou intolerância; tais atitudes, por
vezes, aparecem envoltas em argumentações nada convincentes sobre a laicidade
do Estado. O exemplo é o pedido da Procuradoria Regional de Direitos dos Cidadãos
(PRDC), de São Paulo, para retirar a frase “Deus seja louvado” das cédulas da
moeda brasileira. As argumentações é que o Brasil é um país laico, portanto,
não deve estar vinculado a qualquer manifestação religiosa, e a frase citada
“constrange a liberdade de religião de todos os cidadãos que não cultuam Deus,
como os ateus e os que professam a religião budista, muçulmana, hindu e as
diversas religiões de origem africana”. Logo, a Casa da Moeda informou que cabe
ao Banco Central (BC) “não apenas a emissão propriamente dita, como também a
definição das características técnicas e artísticas” das cédulas. Já o BC
afirmou que o fundamento legal para a existência da expressão “Deus seja
louvado” nas cédulas é o preâmbulo da Constituição, que afirma que ela foi
promulgada “sob a proteção de Deus”. Diante disso, o Secretário Geral da
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Dom Leonardo Ulrich Steiner,
afirma bem que a frase citada nas cédulas de real “não constrange, mas pode
incomodar aos que afirmam não crer. As pessoas que vivem a sua fé, em suas
diversas expressões, certamente não se sentem constrangidas, pois vivem da
grandeza da transcendência. É que fé não é em primeiro lugar culto a um deus,
mas relação. Se a frase lembra uma relação, poderia lembrar que o próprio
dinheiro deve estar a serviço das pessoas, especialmente dos pobres, na
partilha e na solidariedade. Se assim for, Deus seja louvado!”. É importante
também saber que a liberdade religiosa e a correspondente neutralidade do
Estado não significam arreligiosidade ou “ateísmo” público. Um ateísmo público
não seria neutralidade religiosa, mas um credo de caráter antireligioso. Um
“Estado Laico é aquele em que há separação entre duas esferas, com autonomia do
Estado e da Igreja, mas de relação de mútua cooperação, respeitada a liberdade
religiosa e o pluralismo religioso, sem uma religião estatal, tal como se
verifica no Brasil, onde a Constituição Federal de 1988 previu a independência
e colaboração entre o Estado Brasileiro e as confissões religiosas existentes
no País, com a garantia da liberdade religiosa”. Assim, “quando se fala de
Estado Laico, não se pode pensar num Estado avesso ao fator religioso,
agnóstico ou ateu, mas num Estado que respeita a liberdade religiosa”. É
inaceitável atitudes, a título de preconceito religioso, de excluir dos espaços
públicos os símbolos religiosos e retirar a frase “Deus seja louvado” das
cédulas da moeda brasileira. Não duvido da disposição e tempo disponível ainda
para entrar na justiça com uma ação para descer o Cristo Redentor do Corcovado
no Rio de Janeiro, trocar nomes de Estados (São Paulo, Espírito Santo, Santa
Catarina), de cidades com nomes religiosos e acabar com os feriados religiosos
no Brasil. A questão não é reivindicar privilégios para esta ou aquela
religião, nem que o Estado tenha uma religião oficial. Pelo contrário, o Estado
não deve impor a religião, nem discriminar cidadãos por causa dela, mas
assegurar-lhes plena liberdade religiosa; também àqueles que não têm fé. Enfim,
sim, que Deus seja louvado, ontem, hoje e sempre.
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